Por REINALDO JOSÉ LOPES - EDITOR DE "CIÊNCIA+SAÚDE"
DÉBORA MISMETTI - EDITORA-ASSISTENTE DE "CIÊNCIA+SAÚDE"
A versão masculina da pílula anticoncepcional nunca esteve tão perto da realidade, afirma uma pesquisa que acaba de ser publicada numa das principais revistas científicas do mundo, a "Cell".
Por enquanto, a substância, conhecida pelo codinome JQ1, só foi testada em camundongos e ratos, mas isso não impediu os autores do estudo de usar uma linguagem confiante que não é muito comum em artigos científicos.
"Acreditamos que nossas descobertas poderão ser adaptadas completamente para seres humanos, criando uma estratégia inovadora e eficaz de anticoncepcional masculino", escrevem eles.
A bravata faz sentido? Cientistas não envolvidos no estudo dizem que sim. Em primeiro lugar, o método demonstrado por Martin Matzuk, da Faculdade Baylor de Medicina, no Texas, e James Bradner, da Universidade Harvard, é reversível.
Bastou que os bichos usados no estudo parassem de levar injeções da JQ1 para que se tornassem totalmente férteis, gerando filhotes que, pelo que se sabe, são normais.
A substância também não mexe com os hormônios sexuais, como a testosterona. Por isso, o interesse sexual, bem como a capacidade de cortejar fêmeas e copular com elas, ficou intacta nos roedores usados como cobaias.
EMPACOTADO
O alvo da nova droga é uma proteína aparentemente crucial para "desempacotar" o DNA das células que estão virando espermatozoides.
Esse processo complexo, com uma série de passos específicos (veja quadro à dir.), transforma células normais nas criaturas extremamente especializadas que nadam rumo ao óvulo para fecundá-lo.
Em essência, o que a JQ1 faz é travar o desempacotamento, impedindo que os genes certos sejam ativados para essa metamorfose.
O resultado foi uma redução dramática do número de espermatozoides dos bichos: após seis semanas recebendo injeções duas vezes ao dia, só 11% da quantidade normal das células estava presente.
E mesmo os espermatozoides sobreviventes do massacre não "sabiam" nadar -só 5% deles se movimentavam normalmente.
Matzuk disse à Folha que ainda há detalhes a melhorar. "Vamos tentar modificar a nossa molécula para que ela tenha ação mais específica. E também vamos pensar em como aplicar a substância em pacientes humanos."
Segundo ele, o método final poderia ser uma pílula ou injeções que permitam a liberação lenta e gradual da substância no organismo.
Ele minimiza o único efeito colateral da droga nos roedores: a diminuição do tamanho dos testículos, que vai de 15% a 50% nos bichos.
"Isso já é algo normalmente variável nos homens. O importante é que não há efeitos no pênis ou no desejo sexual", afirma Matzuk.
Resta saber se os homens seriam tão assíduos quanto as mulheres ao se proteger.
A empresária Aline Lopes, 31, de São Paulo, usou anticoncepcionais por dez anos e agora deu uma pausa, por causa dos efeitos colaterais. Mesmo assim, prefere não delegar a tarefa a um homem.
"A mulher tem mais disciplina para tomar remédios. Só confiaria se fosse um homem muito caxias, certinho, mas isso é difícil de achar. Prefiro eu mesma tomar."
Para Aline, só depois de muito tempo de relacionamento seria possível entregar a responsabilidade da contracepção a um companheiro. "Não seria algo imediato."
Editoria de arte/folhapress |
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