terça-feira, 29 de setembro de 2009

Pírula do dia seguinte: Só em emergências

Dom, 27 de Setembro de 2009 19:10  
Especialistas alertam para os riscos do uso indiscriminado da pílula do dia seguinte. Pesquisa mostra que as brasileiras conhecem o medicamento, mas o utilizam, na maior parte das vezes, como método rotineiro de contracepção


  • Márcia Neri - Correio Braziliense


  • Elio Rizzo/Esp. CB/D.A Press
    Ana* chegou a tomar a pílula mais de uma vez em um único ciclo menstrual: riscos elevadíssimos de problemas de saúde


    Falar de sexo e de meios para se evitar uma gravidez não desejada deixou de ser um tabu nas grandes e médias cidades do Brasil há algum tempo. No entanto, a desinformação ainda ronda a realidade dos brasileiros quando o assunto é a pílula do dia seguinte. Homens e mulheres nem sempre entendem que o medicamento é uma alternativa de emergência, indicada apenas em situações em que a relação sexual ocorreu de forma desprotegida, em caso de falha de outro método contraceptivo ou de violência sexual.

    O anticoncepcional de emergência chegou ao Brasil no fim da década de 1990, mas nos Estados Unidos a droga já é usada há mais tempo. Alguns estudos revelam que o medicamento é conhecido. O objetivo da droga e a maneira como ela deve ser administrada é que geram confusão. Uma pesquisa desenvolvida recentemente pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) com profissionais e jovens usuários das unidades básicas de saúde de parte da capital paulista comprova a falta de informação.

    O trabalho revelou que menos de 20% das pessoas entrevistadas pela equipe da USP sabiam que a pílula do dia seguinte é indicada para evitar a gravidez apenas em situação emergencial, em que o sexo foi feito sem proteção. Os pesquisadores ficaram surpresos com o desconhecimento. “Parece contraditório, mas percebemos que as pessoas conhecem a pílula do dia seguinte, se posicionam a favor ou contra o medicamento, mas não têm ideia de que ele não é um método rotineiro de contracepção, e sim de emergência”, observa o coordenador da pesquisa da USP, Fernando Lefevre. “Para 30% dos homens e 45% das mulheres, a anticoncepção emergencial serve simplesmente para evitar a gravidez como qualquer outro método. Apenas 17% deles e 13% delas estavam cientes de que essa pílula deve ser usada somente em momentos especiais”, acrescenta.

    Para os médicos, a pesquisa reflete a realidade do país em relação ao assunto. Segundo o ginecologista e obstetra Avelar de Holanda Barbosa, o desconhecimento tem promovido o uso indevido e equivocado da pílula emergencial. “Os acessos à informação apropriada e à saúde ainda são restritos no Brasil. Como consequência, muitas mulheres não tomam a pílula do dia seguinte adequadamente. É necessário orientar a população, assim como foi feito com a camisinha”, sugere.

    O especialista explica que o medicamento de emergência não é um anticoncepcional convencional e que deve ser ingerido no máximo 72h depois da relação sexual desprotegida. “A anticoncepção de emergência torna o endométrio um ambiente inóspito para a implantação do embrião. Os hormônios presentes na droga impedem a ovulação se ela está prestes a acontecer ou dificultam o encontro do óvulo com o espermatozoide”, diz. “É importante salientar que a pílula reduz as chances de gravidez, mas não é abortiva como muitas pessoas julgam. Muito pelo contrário, se a mulher estiver grávida, esse medicamento ajudará a proteger o óvulo”, afirma Barbosa.

    Muitos hormônios
    Alguns estudos sugerem que a pílula emergencial pode ter efeito até cinco dias depois da relação desprotegida. “No entanto, é preciso entender que, depois do ato sexual, quanto antes o remédio for tomado, mais eficaz ele será. Se administrado nas primeiras horas, a efetividade é de aproximadamente 95%. Na medida que o tempo passa, o efeito diminui”, alerta o ginecologista Petrus Sanchez. O médico lembra que a pílula emergencial contém alta dose hormonal, pode causar desconforto em algumas mulheres e não protege contra doenças sexualmente transmissíveis. “O contraceptivo do dia seguinte praticamente não tem contraindicação, mas pode desregular o ciclo menstrual, causar náuseas, vômitos e inchaços em alguns casos. As que abusam do medicamento ficam sujeitas a uma grande irregularidade do período menstrual, o que acaba impossibilitando o cálculo do período fértil”, alerta Petrus.

    A secretária Ana*, 24 anos, já lançou mão da pílula do dia seguinte em diversas oportunidades para evitar a gravidez. “Cheguei a tomá-la mais de uma vez em um único ciclo. Não tinha orientação médica e, quando esquecia de tomar o anticoncepcional convencional, não pensava duas vezes, pois não queria sequer imaginar ser mãe sem planejar”, confessa. O medicamento não causava incômodos, mas o ciclo ficou completamente desregulado. “Quando fui ao ginecologista entendi que, como qualquer remédio, a ingestão excessiva dessa pílula pode trazer consequências. Hoje, me previno com outros métodos e usaria a contracepção emergencial somente em casos de emergência mesmo”, diz a moça.

    A estudante Daniela*, 25 anos, também foi usuária do contraceptivo do dia seguinte por pelo menos três vezes. “Usei em momentos nos quais, por um motivo ou outro, não me preveni e nem estava tomando anticoncepcional convencional. Para evitar uma gravidez indesejada, achei mais prudente tomar a pílula do dia seguinte. Confesso que não me senti bem. A dosagem hormonal é realmente forte e senti muito cansaço, enjoo, meu corpo ficou inchado e tive oscilações de humor também”, conta.


    * Nomes fictícios a pedido das entrevistadas

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