domingo, 22 de fevereiro de 2009

Incidência de Aids triplica em mulheres acima de 50 anos

Sexo protegido também é direito à saúde
NILCÉA FREIRE e JOSÉ GOMES TEMPORÃO

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A incidência da Aids entre as mulheres acima dos 50 anos mais do que triplicou em dez anos, de 3,7 casos por 100 mil habitantes para 11,6
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A DESIGUALDADE entre homens e mulheres faz mal à saúde. Ela é uma das responsáveis pelo fato de a incidência da Aids entre mulheres acima dos 50 anos ter mais que triplicado em dez anos, passando de 3,7 casos por 100 mil habitantes em 1996 para 11,6 casos em 2006, de acordo com o Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde.
Dados parciais de pesquisa de comportamento sexual realizada em 2008 pelo Programa Nacional de DST e Aids mostram que 72% das mulheres nessa faixa etária não usam camisinha com os seus parceiros casuais.
Entre as mulheres de 50 a 64 anos sexualmente ativas, apenas 9% disseram que fazem uso regular de preservativo com qualquer parceiro.
Culturalmente ainda é suposto que são os homens que definem como deve se dar a relação sexual. E o fato de homens e mulheres terem uma vida sexual ativa para além dos 50 anos não implica que as relações de gênero na sociedade tenham mudado. O padrão cultural dominante ainda é machista e patriarcal. A crença na fidelidade e na proteção de relações afetivas estáveis ainda são valores muito presentes nas pesquisas comportamentais que interferem negativamente no uso de preservativo. É fundamental que a população feminina adquira o hábito de dialogar com o parceiro para negociar o uso do preservativo e evitar a infecção pelo HIV.
Os percentuais preocupam as autoridades de saúde tendo em vista que o nível de informação dessas mulheres sobre as formas de transmissão da Aids é alto. De acordo com o mesmo levantamento, 91,8% das mulheres com idade entre 50 e 64 anos sabem que o não-uso de preservativos é uma das formas de transmissão da doença.
Homens e mulheres com mais de 50 anos de idade formam uma geração cuja vida sexual foi iniciada antes do surgimento da epidemia de Aids.
É uma geração que aprendeu, equivocadamente, que a transmissão do vírus estava circunscrita a grupos de risco -homossexuais, em especial.
Por isso os homens maduros foram o alvo da campanha do Clube dos Enta, apresentada no Dia Mundial de Luta contra a Aids (1º de dezembro).
Na população masculina de 60 anos e mais, por exemplo, a notificação de casos de Aids praticamente dobrou em dez anos. A taxa de incidência passou de 11,7 casos por 100 mil habitantes em 1996 para 20,6 em 2006.
Entre esses homens, o uso de preservativos é um pouco maior do que entre as mulheres, mas também é preocupante. Apesar de 95,1% dos homens que estão com idade de 50 a 64 anos saberem que a camisinha evita a transmissão do HIV, apenas 36,9% disseram fazer uso do preservativo em relações eventuais.
Agora, diante do crescimento da epidemia no público feminino acima dos 50 anos, decidiu-se voltar a campanha de prevenção à Aids no Carnaval deste ano para as mulheres maduras. O Bloco da Mulher Madura -mote da ação- traz peças publicitárias para serem veiculadas na TV e no rádio, além de materiais informativos impressos que rompem com os estigmas de gênero e geracionais. O conteúdo pretende incentivar a mulher a ter a iniciativa de propor ao homem a prática do sexo protegido.
Em paralelo às duas campanhas, o governo federal ampliou a aquisição de preservativos para distribuição a Estados e municípios como forma de promover o uso da camisinha.
No ano passado, o Programa Nacional de DST e Aids do Ministério da Saúde repassou 406 milhões de camisinhas.
O número é 3,3 vezes maior do que o que foi disponibilizado em 2007 -um total de 122 milhões.
No início deste ano, o Ministério da Saúde também recomendou aos serviços de saúde facilitar o acesso à camisinha distribuída pelo SUS (Sistema Único de Saúde), deixando de exigir participação em palestras ou apresentação de documentos no momento da entrega dos produtos. Assim, cumprimos o papel do Estado de tornar mais fáceis as escolhas saudáveis. Facilitar o acesso à camisinha atende a essa premissa e reforça as campanhas de prevenção à Aids e às outras DSTs, em todas as idades.
A feminização da epidemia é um fenômeno mundial. Sua geografia, no entanto, coincide com a da desigualdade entre homens e mulheres.
No Brasil, cientes dessa questão, o Ministério da Saúde e a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres lançaram em 2007 um plano específico para enfrentar a disseminação do HIV entre mulheres. O Bloco da Mulher Madura vem reforçar essa estratégia; sem preconceitos, com muito humor e responsabilidade.



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NILCÉA FREIRE, 56, médica, é ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República. Foi reitora da Uerj (Universidade do Estadual do Rio de Janeiro) de 2000 a 2003.
JOSÉ GOMES TEMPORÃO, 57, é ministro da Saúde. Médico, é mestre em saúde pública pela Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz e doutor em medicina social pelo Instituto de Medicina Social da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro).


Fonte: FSP 22/02/2009 - TENDÊNCIAS/DEBATES

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